A política de oferta do ensino
superior, traduzida no aumento constante do número de vagas representou um
pesado investimento estatal. Mas também dos próprios universitários que têm
vindo as suas propinas sucessivamente aumentadas para o número mágico deste
ano, nada menos do que €999.71 (15% de aumento ao ano…). Ainda por cima 24 mil
estudantes defrontam-se com cortes nos benefícios sociais, o que representa um
acréscimo significativo para as famílias. Razões para ficar desesperado? Nada
disso! O sistema desenvolveu novos instrumentos de “solidariedade”: nada menos
do que um pacote de empréstimos bancários, que permitem que os alunos recorram
a estes instrumentos para frequentarem o curso onde foram aceites. Claro que
estes estudantes irão apreciar no futuro o que é o sistema capitalista,
tornando-os reféns (perdão clientes) dos respectivos bancos por períodos que
nem imaginam. Mas se tivermos em conta que em 2010 15 mil clientes terão recorrido
a este processo, com um aumento a um ritmo de cerca de 5 mil em cada ano,
podemos ver que tal não os preocupa excessivamente e que esta progressão está
na razão directa da demissão do Estado das suas funções. Para bem da saúde do
sistema bancário.
Ainda por cima, apesar das
dificuldades na obtenção dum diploma…cada vez é maior o nível de formação dos
desempregados. Duplamente penalizados!!! E essa é realmente a principal nuvem
no horizonte: a possibilidade dos futuros licenciados exercerem as funções cuja
formação tanto lhes custou a adquirir. Na realidade os melhores podem sempre
procurar obter bolsas de investigação da FCT. Em boa verdade, temos de
reconhecer que, onde Portugal mais evoluiu, foi no investimento (e nos
resultados) na política de investigação científica. Lembro-me que este
investimento andava há uns anos pelos 0,4% do PIB, enquanto que esta
percentagem mais que triplicou até ao momento. A criação de Centros de
Investigação e Laboratórios Associados, o elevado número de bolsas (iniciação,
doutoramentos, post-doc, etc.) tem permitido apostar na investigação e diminuir
os números estatísticos dos desempregados. Mas a precariedade dos
investigadores é enorme, não têm direito a subsídio de desemprego, apenas um
magro apoio em caso de doença conferido pelo Seguro Social Voluntário, além de
que o pagamento das bolsas sofre atrasos cada vez mais consideráveis.
E o desemprego universitário cresce
continuadamente… Vamos a ser claros: outra coisa não seria de esperar dum
pequeno país com 15 universidades e 15 Politécnicos. Lembro-me que há uns anos
fiz um estudo para a Ordem dos Engenheiros sobre cursos de Ambiente (onde fui
avaliador das instituições) e descobri 36 cursos só desta área a nível
nacional… O crescimento anárquico de instituições (ainda tenho presente há
muitos anos a manifestação dos comerciantes de Vila Real a apelarem á criação
da Universidade…), que serviram os desígnios partidários locais, e as regras de
financiamento do ensino superior público, baseadas nas entradas no 1º ano, levaram
à proliferação de cursos que eram apelativos e que garantiam aumento aumentos
de receitas aos Reitores. Todavia, cedo se transformaram em fábricas de
desempregados. Lembram-se da falta de enfermeiros? Em poucos anos passaram de
estudantes motivados a visitantes assíduos dos centros de emprego… Mas na
realidade vejamos o interior Norte: é possível manter, numa situação de perda
demográfica intensa, os mesmos cursos em Viseu, Vila Real e Bragança, a
competirem entre si sem qualquer articulação, com responsáveis de costas
voltadas como se de instituições privadas se tratasse? E onde se vão fixar
estes licenciados? Vão contribuir para o desenvolvimento regional? Sabemos a
resposta não é? E o mesmo se passa por todo o país…
Tem de haver uma revolução a
vários níveis. E é para isso que o Bloco serve, pelo menos para termos de
propostas inovadoras e abrir frentes de debate sem preconceitos e clientelismos.
Algumas achas para a fogueira para pensarmos nisto:
_Um dos problemas de arrancar os
cabelos é a multiplicação de instituições universitárias e de cursos (800
licenciaturas em Portugal! Comparem-nas com as 200 em Espanha…), aspecto
insustentável num país rico, quanto mais num país pobrezinho como o nosso.
_Outra questão diz respeito à
mentalidade do estudante universitário: total ausência de espírito de
empreendedorismo! Pensa-se: onde posso arranjar um emprego e não, como posso
constituir uma empresa.
_Mas temos também o imobilismo do
docente universitário: ausência completa de mobilidade entre instituições. Poderia
apenas citar o caso dos EUA onde ninguém pode ficar empregado na instituição
onde termina o doutoramento e onde um critério privilegiado de selecção tem a
ver em quantas instituições o docente já trabalhou.
Mas a questão do desemprego tem mesmo
de assentar em perspectivas sociais completamente distintas. Na verdade recordo-me
de ir a países de Leste antes do fim da “cortina de ferro” onde algo que eu
admirava era o pleno emprego de qualquer universitário. É verdade que tal
diminuía a competitividade, tinha encargos estatais elevadíssimos, os salários
eram baixos (um catedrático que visitei na Polónia tinha de vender no mercado os
produtos hortícolas que cultivava no jardim de sua casa para conseguir que a
família tivesse uma vida digna…), etc., etc. Mas não havia a terrível frustração
que se verificava a este nível nos países ocidentais. Não defendo exactamente
esta política, pouco abonatória da qualidade e da avaliação das capacidades.
Mas defendo a forte nivelação dos salários (função pública) e de aumentos de
impostos significativos dos salários superiores do sector privado (afinal o
desnível em Portugal é dos maiores da Europa) de modo a criar bolsas de emprego
que procurem reduzir o desemprego para níveis meramente residuais. É urgente
uma política de reformas com pensões parciais no sector estatal mas para
permitir a entrada dum elevado número de jovens formados. Afinal o pleno
emprego das gerações mais velhas (e as reformas completas) não podem penalizar
continuamente quem procura o primeiro emprego. Há coragem para dizer isto? É
claro que os custos a nível de impostos serão elevadíssimos, mas a sua
canalização para estas bolsas deve ser prioritária. Trata-se “apenas” de salvar
as próximas gerações.
Mas também na verdade todo o
ensino superior assenta numa estrutura incomportável que tem de ser modificada
de alto a baixo. Muita gente perderia privilégios, é verdade. Mas só um Estado
verdadeiramente social pode deixar de continuar a pedir cada vez mais
sacrifícios para quem quer tirar um curso, para depois o mandar pegar nas malas
e pô-lo na fronteira.
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